OS VIRTUAIS

SANTIAGO

 

O vento embatia-lhe no rosto, como se o culpasse por algo. Era forte e traiçoeiro, trazendo grãos de areia invisíveis que perturbavam a visão. Não estava um dia frio, pelo contrário, apenas uma manhã de vento igual a tantas outras por ali. Sentado num banco de madeira, avistava o mar fustigado pelas vagas que as rajadas ventosas incitavam.

A tranquilidade do lugar era reconfortante, mas impotente para o seu espírito transtornado. Era cedo e quase não se via ninguém por ali, por aquele passadiço de madeira que ligava várias praias a sul do rio Lima. A linha do horizonte mal se distinguia entre azuis de céu e mar, onde ilhéus de espuma branca brotavam entre a ondulação.

QUARTZO FUMADO

I

O tempo não pára, esgota-se!

E naquela tarde, esse esgotamento ganhou um peso tenebroso.

O frio ainda não se fora embora, dificilmente iria numa cidade normalmente gélida no Inverno e amenamente fresca no Verão. A Primavera estava a chegar, mas ainda se viam resquícios da neve a derreter nalguns cantos sombrios da cidade.

A CAMINHO DO TEU NOME

 

Já alguma vez olharam para o passado e recordaram aquele momento na vossa vida em que lhe podiam ter dado qualquer destino? Talvez não um momento exacto, mas uma época, uma idade em que o futuro era um caminho que poderia seguir qualquer direcção. Olharem para trás e pensarem que nesse tempo, ainda era possível ter feito isto ou aquilo? Poder decidir sem pensar nas responsabilidades que o avançar dos anos trazem, na falta de coragem para arriscar, nas amarras que já não temos força para soltar.

TROVOADAS DE VERÃO

I

Atlântico Norte, 14 de Agosto de 2008. A noite estava escura, mergulhada na completa ausência de luar. Um cargueiro navegava pelo extenso oceano acompanhado pelo ruído do cortar da ondulação e o som ténue dos motores. Era um navio comprido, carregado com dezenas de contentores de várias cores. Deixara o porto de Lisboa e navegava para o Canadá com escala prevista no porto de Ponta Delgada na ilha de São Miguel nos Açores.

DANÇANDO NO VIOLINO

I

A noite invernosa não passava de um prolongamento de uma tarde fria e chuvosa de mais um dia no apogeu do Inverno. Se fosse possível encontrar algum ponto agradável naquele serão, só a ausência da chuva merecia alguma congratulação, pois as nuvens pareciam ter esgotado as reservas durante a manhã e a tarde.

NUNCA NEVA NO MEU ANIVERSÁRIO

I

Não fosse o momento e o ambiente envolvente poderia ser apreciado com a devida honra. O céu estava azul, o sol brilhava e o mar ao longe parecia calmo. Na minha frente, imponente, o cume da ilha do Pico elevava-se sobre as nuvens, como que espreitando do lado de lá do canal, por cima da mancha urbana da Horta. A brisa fresca, ténue e agradável, soprava-me o rosto. Como seria bom desfrutar daquele cenário noutra circunstância.